CASA DOS ARCOS
Muito Prazer!
As histórias da casa mais famosa de Pedras Grandes
(Júlio Cancellier, mestre em Cinema Digital e Produção Televisiva pela Universidade Católica de Milão e Agnaldo Filippi, bacharel em Direito pela Unisul)
Muito prazer! Meu nome é Casa dos Arcos. Mas pode me chamar de Casa Zaboti, Casa do Imigrante Maziero, da Estrada de Ferro ou da Companhia Metropolitana. Sou bem antiga, mas não sei exatamente o ano que nasci, quem me construiu e para que servi. Faço muitas selfies, fotos de casamento e estou sempre posando para os cliks dos turistas que visitam minha cidade. A verdade é que sou muito famosa e todos me conhecem assim: a Casa dos Arcos de Pedras Grandes.
Esta breve introdução aponta para o quanto ainda temos que descobrir sobre o famoso casarão tombado como Patrimônio Histórico que chama a atenção de quem chega à Pedras Grandes, berço da colonização italiana no Sul de Santa Catarina.
Há uma grande confusão nas informações sobre a data de construção, a quem pertenceu e a respeito do próprio nome. As dúvidas, que começam por como ela é chamada, não decorrem de uma suposta falta de identidade, mas em virtude da múltipla significação que representa.
A sua existência está ligada a importantes fatos históricos que marcaram a região Sul de Santa Catarina, desde o final do século XIX aos dias atuais, como a fundação da Colônia Azambuja em 1877 e a construção da Estrada de Ferro Dona Tereza Cristina, entre 1880 e 1884. Por sua longevidade, a casa passou por muitos proprietários e a cada período, uma mudança de nome, bem como foi multifuncional, servido como escritório, alojamento, casa comercial e moradia.
A história da Casa dos Arcos
De acordo com o site Ipatrimonio.org, a Casa dos Arcos de Pedras Grandes foi construída por volta de 1900. Já o professor Antônio Afonso Felippe afirma que o casarão de Ilhota foi construído por volta de 1890. (Reis, 2021)
A história do imponente casarão começa, entretanto, antes mesmo da sua construção, com a compra pela EFDTC do terreno onde ele está situado, a cerca de 1.280 metros da estação de Pedras Grandes. A casa está localizada exatamente no km 76,190 da linha de 110 km que ligava Imbituba às minas. Segundo Zumblick (1987, páginas 39 a 51) este terreno em Ilhota foi vendido pelo Sr. Albino B. de Oliveira, por 170$000 (Valor em réis).
Neste período histórico, observamos a construção de outro belo casarão no centro de Pedras Grandes – a Casa Raciné Ghisi (1898), que também possui aberturas em arco pleno, no mesmo estilo arquitetônico da Casa dos Arcos. Os vidros das janelas têm o mesmo corte. Os detalhes nas colunas são rigorosamente iguais. Percebe-se também o uso dos arcos em construções padrões da EFDTC, como as estações Cresciuma e Sangão, que foram edificadas nesta mesma época. (Teixeira, 2011, p. 245, 250)
Com relação a data de construção, as versões de Ipatrimonio e Felippe parecem aceitáveis, já que entre 1877 e 1895 a região recebeu uma grande quantidade de imigrantes italianos, para as Colônias de Azambuja (1877), Grão-Pará (1882) e Nova Veneza (1891), transformando Pedras Grandes em importante centro comercial e industrial.
Residência e escritório da Estrada de Ferro
Antônio Afonso Felippe afirma que o casarão foi “concebido pela direção e engenheiros da Estrada de Ferro Donna Thereza Christina” (Reis, 2021). A Casa dos Arcos localiza-se em faixa de domínio do eixo da antiga via férrea, o que leva a crer que tenha sido construída em porção de terreno da EFDTC. Ha versões que foi domicílio e escritório dos engenheiros da mesma ferrovia.
Havia já naquela época interesse dos investidores ingleses na região, projetando a expansão da ferrovia até o vale do Araranguá, com a construção de um novo ramal partindo de Pedras Grandes, passando por Azambuja, Urussanga, Criciúma, para chegar ao extremo Sul. A grande enchente do Rio Tubarão de 1887, que destruiu grande parte da malha ferroviária, e a baixa competitividade do carvão fizeram com que os planos mudassem, culminando com a desistência dos ingleses. Em 1902 o governo brasileiro encampou a ferrovia,
Crescendo a passos largos, Pedras Grandes alimentava o sonho de expansão da linha férrea através de seu território. “Os prédios, uma arquitetura um tanto pesada, eram olhados como balizas anunciadoras, ao longo da linha, dos próximos pontos de parada dos trens e núcleos iniciadores de vilas ou cidades” ( Zumblick, 1987). O local ideal para a construção de uma oficina central, sede da Estrada de Ferro e residência dos dirigentes maiores seria justamente Ilhota.
A Casa dos Arcos teria a funcionalidade necessária, pois era bem localizada e ampla, integrando-se ao complexo pensado para ser a central da empresa. Mas em 1919 o novo ramal foi construído, partindo de Tubarão onde a sede da empresa já estava estabelecida.
A propósito, Marlene Zabot, em postagem sobre a Casa dos Arcos, na página Memórias de Tubarão SC e Região no Facebook, afirma: “Relato de Denise Garbelotto, moradora de Pedras Grandes, que foi cartorária nesta cidade e conhecedora das histórias da região: O casarão da foto foi construído para moradia do superintendente da ferrovia, o sobrenome era Schafler, por volta de 1920.”
O Sr. “Schafler”, a que ela se refere, seria o bisavô do juiz Márcio Schiefler Fontes que confirma saber desta informação. Como Juiz Eleitoral da Comarca de Tubarão, Schiefler Fontes visitou certa vez a Câmara de Vereadores de Pedras Grandes e mencionou a ligação histórica da família com a Casa.
Mas o fato de que teria sido superintendente carece de confirmação. Os superintendentes da EFDTC nesta época foram Augusto Cezar de Pinna, de 1908 a 1916 e Ernani de Bittencourt Cotrim, entre 1920 e 1922 (Teixeira, p. 177)
No livro sobre a história da Ferrovia Tereza Cristina há uma citação a Roberto Schieffler, como sendo em 1904 o Chefe de Tráfego da empresa, um cargo elevado da administração que em 1885 recebia o vencimento de 30 libras, menor apenas que as 100 libras do superintendente e 50 libras do contador (Teixeira, p. 26).
Moradora por muitos anos da localidade de Ilhota, Juçá Zabot Lemos, que era casada com Afonso Zanella, contou certa vez ao neto, Agnaldo Filippi, que durante um tempo o Sr. Schiefler residiu na Casa dos Arcos, que fica bem em frente à propriedade da família. Dona Juçá era afilhada de Schiefler, que era grande amigo do casal de comerciantes Olavo Lemos e Lídia Zabot, pais de Juçá. Anos mais tarde, o padrinho de batismo de Juçá foi morar em Florianópolis, e todos os ano, nas férias escolares, ela ia visitá-lo na capital.
Casa Comercial da Companhia Metropolitana
O professor Antônio Afonso Felippe lança outra hipótese: “O casarão serviu inicialmente como casa comercial da Companhia Metropolitana, mantenedora da ferrovia” (Reis, 2021).
Em “Ferrovia Tereza Cristina: uma viagem ao desenvolvimento” (p. 70, 71), José Warmuth Teixeira apresenta relatório que atesta a estreita colaboração da EFDTC com a Companha Metropolitana, a concessionaria de Colônia Nova Veneza criada em 1891.
Além de organizar a vinda de imigrantes para a nova colônia e seus núcleos, a Cia. Metropolitana, sucessora da empresa Angelo Fiorita e Cia, dirigida por Miguel Napoli, adquiriu estabelecimentos industriais e comerciais, notadamente em Nova Veneza. A exportação dos produtos era feita a partir de Pedras Grandes, sendo o elo das colônias e a ferrovia.
Assim é possível identificar uma intensa movimentação comercial em Pedras Grandes no último quartel do Século XIX, sendo local ideal para a Companhia Metropolitana instalar uma de suas casas comerciais, em local estratégico, junto a ferrovia.
Residência de Imigrantes
A FCC – Fundação Catarinense de Cultura identifica que a “Casa dos Arcos Zaboti” ou “Casa centenária”, serviu como “residência do imigrante italiano Fioravante Maziero”, nascido em 23/03/1888 na ex-colônia Azambuja, Pedras Grandes.
Carlos A. Maziero, Professor e pesquisador do Departamento de Informática Laboratório de Redes, Sistemas Distribuídos e Segurança da UFPR – Universidade Federal do Paraná, pesquisou a origem das famílias em Santa Catarina, relacionada a imigração italiana.
Sobre a família Masiero em Pedras Grandes (região de Tubarão), Carlos A. Maziero cita que de acordo com as informações fornecidas por Denise Garbellotto Fraga, escrivã do Cartório de Paz do Distrito de Azambuja, Município de Pedras Grandes SC (perto de Tubarão), apenas uma família de imigrantes com sobrenome Masiero se instalou na região.
Tommaso Masiero imigrou de Zimella – Verona, para a localidade de Azambuja, por volta de 1885. Ele era casado na Itália com Hermenegilda (ou Remigilda) Frigo e veio juntamente com seus filhos.
Um dos filhos de Tommazzo, o também imigrante Giuseppe (n. 7/3/1867 S. Stefano Protomartire, Zimella Verona Itália, f. 07/09/1918 Azambuja SC), casou-se com Amabile Pasetto (n. 1869, f. 21/01/1940), filha de Ângelo Pasetto e Maria.
Neto dos italianos Tommazzo e Hermenegilda (de parte de pai) e Ângelo Pasetto e Maria (de parte de mãe), Fioravante era filho de Giuseppe e Amabile.
Conforme Reis (2021), “Luiz Masiero e o irmão, filhos de Fioravante Masiero, arrendaram a casa. Filho de Luiz, Edemir Masiero e Bernadete Lembeck Masiero, tão logo se casaram, em meados do século passado, decidiram que era hora de se mudar para a casa à beira do trilho. O jovem casal compartilhava o casarão com a numerosa família do irmão de Edemir, pai de 12 filhos. O casal viveu por 13 anos na Casa dos Arcos, inclusive após a saída do irmão de Edemir e sua família. Até que, ainda aos 35 anos, Edemir resolveu viajar com o caminhão novo para São Paulo. No meio da rota, um acidente tirou-lhe a vida. Bernadete e a filha passaram a morar em outra casa, no mesmo bairro, em contraste à agitação da antiga residência.”
Em 1974, parte do sítio foi destruído pela enchente. “Na frente da casa e nos fundos, havia parreiras de uva com que Edemir e o irmão fabricavam vinhos, que, depois de armazenados no sótão, eram vendidos na região, juntamente com a produção de jabuticaba. Eles mantinham também estufas de fumo e uma plantação de banana às margens do rio, que acabou sendo destruída pela enchente de 1974. A eletricidade só chegou quando a segunda filha de Edemir e Bernadete completou dois anos de idade”. (Reis, 2021)
Tombamento
O casarão foi tombada como patrimônio material de Santa Catarina através do Decreto Nº 5.919, de 21 de novembro de 2002 e consta do Catalogo de Bens Tombados pela FCC, de janeiro de 2021 (P.T. no: 173/2000, referente a Casa dos Arcos – abrangendo jardins, ranchos, cercas, poços, estufas e edifícios anexos, entorno de 300 metros 28°26’01″S 49°10’25.6″W http://bit.ly/39vSCWZ).
O Decreto que homologou o tombamento do imóvel foi assinado pelo governador Esperidião Amin:
HOMOLOGA TOMBAMENTO DE IMÓVEIS.
O GOVERNADOR DO ESTADO DE SANTA CATARINA, usando da competência privativa que lhe confere o inciso III, do art. 71 da Constituição do Estado, de acordo com o disposto na Lei nº 5.846, de 22 de dezembro de 1980, alterada pela Lei nº 9.342, de 14 de dezembro de 1993, e tendo em vista o que consta dos Processos da Fundação Catarinense de Cultura protocolados sob no PFCC 1588/028, DECRETA:
Art. 1º Fica homologado o tombamento, nos termos do art. 4º da Lei nº 5.846, de 22 de dezembro de 1980, alterada pela Lei nº 9.342, de 14 de dezembro de 1993, do imóvel situado à Estrada Geral de Pedrinhas, localizado no município de Pedras Grandes.
§ 1º – A proteção deverá abranger jardins, ranchos, cercas, poços, estufas e edifícios anexos por se tratarem de bens de referência cultural.
§ 2º – Como medida geral é considerada tombada a área situada entre a via pública até a linha dos fundos do bem ou do último de seus componentes anexos acima especificado, em toda largura do lote.
Art. 2º Considera-se como entorno da área protegida, para os efeitos do art. 16 da referida Lei, a faixa contida nos 300 metros tomados de cada uma das extremidades do bem.
Art. 3º Os imóveis serão inscritos no Livro do Tombo Histórico da Fundação Catarinense de Cultura.
Art. 4º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Florianópolis, 21 de novembro de 2002.
ESPERIDIÃO AMIN HELOU FILHO
Governador do Estado
O site Ipatrimonio.org também apresenta descrições da Casa utilizando como fonte a UDESC e a FCC.
Segundo a UDESC,
“A casa foi construída por volta de 1900, serviu como residência do imigrante italiano Fioravante Maziero. É um significativo exemplar da arquitetura ítalo-brasileira – que se desenvolveu na região do vale do Tubarão – e representa um período de prosperidade da região, compreendido entre o final do século XIX e início do XX. Construída em alvenaria autoportante – ou seja, que serve como estrutura – de tijolos, tem um pavimento térreo e o sótão. Possui planta retangular e telhado em duas águas, coberto por telhas francesas. Os ambientes internos são espaçosos; um corredor central liga a sala e a cozinha – nos extremos da casa – aos demais oito cômodos. É conhecida como “Casa dos Arcos” devido às aberturas emolduradas em arco pleno, que na fachada voltada para rua são dispostas simetricamente. De cada lado, dois óculos – aberturas circulares – conferem luminosidade ao sótão. Os detalhes possuem inspiração clássica. O esmero das fachadas da edificação é contrastado com a simplicidade do pequeno anexo de serviço situado perpendicularmente em relação ao volume principal.”
A descrição da FCC é a seguinte:
“A edificação possui caráter excepcional pelas suas dimensões e características urbanas, apesar de encontrar-se implantada em área rural. Desenvolve-se em pavimento térreo mais sótão, com planta retangular e telhado em duas águas. Suas aberturas são em arco pleno com janelas e portas em duas folhas de abrir e bandeiras fixas envidraçadas.”
A compra da casa
A Casa foi colocada a venda com o seguinte anúncio: O imóvel “!!oportunidade!! casa dos arcos” possui 5 dormitórios, venda por R$1.500.000 e está localizado em Pedras Grandes, SC. um antigo e lindo casarão, denominado casa dos arcos, medindo 21:50m. Por 10:10m com a área de terra de 6 hectares, localizado as margens da SC 390 no município de Pedras grandes no sul de santa catarina, otimo para quem quer investir em um restaurante, café colonial, pousada, residência, festas e eventos. O local é estratégico pois esta localizado entre varias praias e a caminho da serra do rio do rastro com um enorme transito de turistas.
No dia 25 de outubro de 2021, a Câmara de Vereadores de Pedras Grandes aprovou por unanimidade projeto de lei enviado pelo prefeito Agnaldo Filippi para desapropriação ou compra amigável do imóvel.
No dia 26 de outubro de 2021 foi anunciada pelo prefeito Agnaldo Filippi, através das redes sociais, a compra da Casa dos Arcos pelo Município de Pedras Grandes, adquirida em negociação com Nazarete e sua Mãe.
O imóvel foi comprado para ser um espaço cultural e de eventos, no valor de R$ 850.000,00 com recursos viabilizados pelo deputado estadual José Milton Scheffer.
Sobre a compra da Casa dos Arcos, Toninho Felipe comentou no Facebook:
“Decisão muito importante. Eu também pensei e escrevi sobre a construção e uso dessa obra por engenheiros da estrada de ferro. Após novas pesquisas e descobertas, posso afirmar que a obra NÃO tem nenhuma relação com a estrada de ferro. Espero poder apresentar, em breve, documentos que comprovem o que estou afirmando. Acho de muita importância restaurar a obra e recontar a sua história. Parabéns ao prefeito Agnaldo, vereadores e a todos que tenham participado do processo aquisitório”.
Dilva Estevam Duarte também comentou:
“Que maravilha! Parabéns! Essa casa fez parte da minha infância, ia sempre comprar farinha de milho, pertencia a família Mazieiro! Bela conquista para o municipio, restituindo história, preservando o passado!
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